sábado, 11 de setembro de 2010

Um poema de César Vallejo


OS PASSOS REMOTOS

O meu pai dorme. O seu nobre semblante
é como um coração apaziguado;
está tão doce agora...
se há nele algo de amargo, serei eu.

Há solidão na casa; e reza-se;
e dos filhos não houve hoje notícias.
Meu pai acorda, considera
a fuga para o Egito e um suspenso adeus.
Está agora tão perto;
se há nele algo distante, serei eu.

E minha mãe passeia além na horta,
saboreando um sabor já sem sabor.

Está agora tão suave,
tão longínqua, tão amorosa e nítida.

Há solidão no lar sem reboliço,
sem notícias, sem verdes criancices.
E se há algo quebrado nesta tarde
que diminui e crepita
são dois velhos caminhos brancos, curvos.

Por eles vai a pé meu coração.

César Vallejo nasceu em Santiago de Chuco, a 16 de março de 1892. Integrado às vanguardas do século XX, é considerado um dos mais importantes poetas hispano-americanos. O peruano começa sua vida literária com Los heraldos negros (1918) e na poesia publica ainda Trilce (1922) e Poemas humanos (1939). Também escreveu romance, conto, crônica, ensaio e teatro. Morreu em Paris no dia 15 de abril de 1938. 

* Tradução de Nicolau Saião