quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Dois poemas de Jorge Fernandes




REDE
 
Emboladora do sono...
Balanço dos alpendres e dos ranchos...
Vai e vem nas modinhas langorosas...
Vai e vem de embalos e canções...
Professora de violões...
Tipoia dos amores clandestinos...
Grande...  larga e forte...  pra casais...
Berço de grande raça.


Guardadora de sonhos
Pra madona ao meio-dia
Grande... côncava...
Lá no fundo dorme um bichinho...
—  Balança o punho da rede pro menino dormir.


MODERNO

Tomou o martelo pesado todo cheio de barro
E tocou a destruir todo verso bem feito...
Malhou nas ogivas dos decassílabos: — tá! tá! tá!...
E os pedaços de cornijas caíam pelo chão relvoso
Numa monotonia de pedaços de cornijas...
Fez cair todas as flores-de-lis que corneavam as janelas
E sobre o montão novo de ruínas de versos sonoros
Começou a viçar toda a vegetação alegre da terra:
Pés de jurubebas, canapuns, pinhões se erguiam...
As flores que ainda não foram vistas: azuis — amarelas — vermelhas — pintadas.
As folhas viçosas dos mata-pasto...
Lagartixas... Calangos num sim-sim de cabeça se estiravam
Ao sol gostosamente quente...
Melões de São Caetano enfeitavam todo o basculho
Da arquitetura colonial...


Jorge Fernandes nasceu a 22 de agosto de 1887, em Natal. Publicou em vários jornais de sua cidade como O potiguar, O tempo, A rua, Pax. Escreveu pequenas peças de teatro e alguns contos. Mas se destacou como poeta. Parte de sua obra poética foi publicada no único livro que viu em vida, Livro de poemas (1927), editado então com depoimento de Luiz da Câmara Cascudo. Morreu no dia 17 de julho de 1953.