segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

Quatro poemas de Moacir Amâncio



Sísifo

não ovo
a carga da pedra
é vazia
joia que se abole
pelo escuro

precisa invenção
define
o breu entre
anjo e molusco

sem asa ou concha
arrasta
ausência de pedra
e peso

A alquimia dos ratos

miméticos
roem
a luz

de repente
caem
gordos - mortos?
de transparência

revelam-se
em ouro
e outros infinitos

* De Do objeto útil


Origami

As cores no piano
ignoram a terceira
que repara na sombra
de novo um fruto.

Nuances passam frias
do resíduo diálogo
segundo o olho fora,
imposição.

Manchas se fazem mãos
móveis pelo papel.
Se duvidas, amassam
o continente.

E farão desse céu
triângulo, esfera
capaz de moto próprio
outra pupila.

* De Figuras na sala


Bodegón

Um canto do Museu do Prado
guarda certo pintor estranho,
total ausência é o divino.

Pensava os erros dos demais
à maneira do Bosco não.
Mais longe essências corrigia.

Os tortos entrega à festa
das coisas esperando o assombro:
a mesa só queijos, o galo

todas as manhãs na bandeja.
Mostrou saber o coração
kitsch armário tão romãs.

* De Contar a romã