segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Um poema de René Crevel



OLHAR

Teu olhar cor de rio
É água que muda, em arranjo
Com o dia saciado no cenário.
Madrugada, Vestido de anjo
Um naco do manto celestial
Sob teus cílios, entre as margens
Se fez. Flui, flui viva água em paragens.
A noite parte, mas o amor permanece
E minha mão sente bater um coração.
A alvorada quis adornar nossos corpos com sua acalmação.
Corpo-de-Deus.
O desejo matinal retomou nossos corpos nus
Para esculpir uma carne que acreditávamos cansada.
Sobre os rios ao longe barcas já desancoradas.
Nossas peles depois do amor têm cheiro de pão quente.
Se a água dos rios está pelos nossos membros,
Teus olhos lavarão minha alma;
Mas teu olhar líquido ao meio-dia que eu temo
Se transformará em chumbo?
Eu tenho medo do dia, do dia pesado como um jumbo
Do dia que sacia teu olhar cor de rio
Ou numa noite pavimentada por gêmeos triunfos
Se a vitória grita a volúpia dos anjos,
Revele-se nela a Majestade de um Ganges.

* Tradução de Lucas Guimaraens