sexta-feira, 11 de março de 2016

Dois poemas de Cacaso



HORA DO RECREIO

O coração em frangalhos o poeta é
levado a optar entre dois amores.

As duas não pode ser pois ambas não deixariam
uma só é impossível pois há os olhos da outra
e nenhuma é um verso que não é deste poema

Por hoje basta. Amanhã volto a pensar neste problema. 


POÉTICA

       Alguma palavra,
este cavalo que me vestia como um cetro,
algum vômito tardio modela o verso.

Certa forma se conhece nas infinitas,
a fauna guerreira, a lua fria
encrustada na fria atenção.

Onde era nuvem
sabemos a geometria da alma, a vontade
consumida em pó e devaneio.
E recuamos sempre, petrificados,
com a metafísica
nos dentes:          o feto
                  fixado
entre a náusea e o lençol.

Meu poema me contempla horrorizado.

Rio de Janeiro, 1965.

Cacaso nasceu a 13 de março de 1944 em Uberaba, Minas Gerais. Cedo foi morar no Rio de Janeiro, onde viveu o restante da sua vida. Estudou Filosofia, foi professor na PUC e colaborador regular de várias revistas e jornais. Foi um dos nomes da chamada geração mimeógrafo e ganhou destaque na antologia 26 poetas hoje, organizada por Heloisa Buarque de Hollanda. Publicou o primeiro livro em 1967, A palavra cerzida. Depois, vieram outros cinco títulos: Grupo escolar (1974), Beijo na boca e Segunda classe (1975), Na corda bamba (1978) e Mar de mineiro (1982). Morreu a 27 de dezembro de 1987.