segunda-feira, 4 de novembro de 2019

Dois poemas de Bogumil Diúzel




O espaço não está vazio
ele pode ser uma parede
que rompe a cabeça
rochedo que cega a picareta
diamante que nos escalpela

O espaço está vazio somente

dentro de mim e da matéria
pela qual inúmeros viajantes sem bagagem
passam depressa sem passaportes
vão adiante ou retornam

Lá no vazio também tenho

a minha órbita para sempre despegada
que será povoada quando o de ontem
colidir com o eu de amanhã
anular-se-á ou voltará no tempo

passará desapercebido pelas quanta de tudo


O ventre na palma da mão

Lago afora a chuva vai-se embora
feito cavalaria fantasma – somente cascos desgastados
são realidade, e cada um com afiada ponta bifurcada
a rasgar cada poro da epiderme lacustre
em vez de chagas porém brotam crostas-arrepios

Eriçou-se esse animal e serenou
e passou a lamber as próprias peles
com a longa língua longos plátanos enfileirados
estirados por ninfas com bolhas de sabão e espuma
para que na elevação sobrenadem pedaços de madeira e restos

Farfalharam os secos caniços fúlvido-alvos
(a lança neles transforma-se de verdade?)
enxugando as próprias asas – em breve germinarão
novas penugens verde-azuladas, penas e bicos
– marrecos que emergem, cormorões que submergem .....

A extensa Água revolve e renova o ventre
em meio às alvas nuvens esparramadas surgem nódoas
o azul-escuro o brilho do sol mas sobre a palma da mão do lago
da transparência profunda emerge até o firmamento
esmeralda gigantesca – ovo de Páscoa em fita rubro-branca sobre o arco-íris

Ohrid, final de Março

Bogumil Diúzel nasceu em Čačak, na Sérvia, em 1939. Estudou Língua e Literatura Inglesas na Universidade de Skopje, na Macedônia, e, mais tarde, na Universidade de Edimburgo, na Escócia.

* Traduções de Aleksandar Jovanović; a primeira publicada na revista Modo de usar e a segunda nos Cadernos de Literatura em Tradução da USP (n. 17)




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