terça-feira, 31 de março de 2020

Quatro poemas de Luigi Pirandello




CONVERSANDO

A vida então no fundo
merece seu louvor,
a máquina do mundo
bem composta lhe parece, meu doutor.
Sim, sim, não nego... De fato há certas cenas
que são bem feitas, plenas.
Já admirei ocasos defronte,
e encantadoras auroras,
estas a rir nos montes,
aqueles a enevoar mar afora.
E que saltos no peito!
Aliás às vezes quase estive
para aplaudir no afã.
Depois me contive.
Será igual, mais ou menos, amanhã.
Este é o defeito, a meu ver, doutor:
pouca variedade... sempre iguais
as coisas... e enjoa por fim o espectador.


OS ÓCULOS

Eu tive outrora um par
d’óculos verdes; o mundo
verde eu via ao olhar
sendo feliz e fecundo.

Até esbarrar num senhor
de ar tristonho e autista.
― «Verdes? ― diz a rigor.
Vão te estragar a vista.

Eis, os meus experimente:
verás as coisas como são!» —
Peguei-os. Fui crente.
E vi só um negro vão.

Enjoo em meia hora
d’um mundo dessa alçada,
joguei tais lentes fora,
e então não vi mais nada.


A TAREFA

Minha tarefa é esta: a de passar
por homem melancólico e grave,
pescador que para sempre escave
pérolas negras no fundo do mar.

E ai de mim se eu faltar com esta gente
ao conceito que de mim está formado
ou então, se como fui imaginado
provo não ser essencialmente.

Amiúde muitas coisas, ah tão sérias!
me fariam rir até escangalhar a boca.
Porém, minha tarefa, e o que me toca
é suspirar com lábios mudos: ― Misérias!...


EU SOU ASSIM

Quando lograres não ter mais um ideal,
porque observada a vida é símil a enorme palhaçada,
sem nexo, sem explicações jamais;
quando não tiveres mais um sentimento,
porque enfim já não estimas,
nem cuidas mais de homens e de coisas,
e portanto te falta o hábito, que não encontras,
e a ocupação, da qual desdenhas
quando tu, numa palavra, viveres sem a vida,
pensares sem o pensamento,
sentires sem o coração
então não saberás o que fazer:
serás um andarilho sem casa,
um pássaro sem ninho.
Eu sou assim.

Luigi Pirandello nasceu a 28 de junho de 1867 em Agrigento. Autor de vasta obra, incluindo prosa (novela, conto e romance) e poesia, ficou reconhecido por produção com dramaturgo. Recebeu, em 1934 o Prêmio Nobel de Literatura. Morreu em Roma no dia 10 de dezembro de 1936.

* Traduções de Fabio Malavoglia.



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