IV
Não digais
que esgotado seu tesouro,
de assuntos
falta, emudeceu a lira;
poderá não
haver poetas; mas sempre
haverá
poesia.
Enquanto as
ondas da luz ao beijo
palpitem
acesas,
enquanto o
sol as desgarradas nuvens
de fogo e
ouro vista,
enquanto o
ar em seu regaço leve
perfumes e
harmonias,
enquanto
haja no mundo primavera,
haverá
poesia!
Enquanto a
ciência a descobrir não alcance
as fontes da
vida,
e no mar ou
no céu haja um abismo
que ao
cálculo resista,
enquanto a
humanidade sempre avançando
não saiba
para onde caminha,
enquanto
haja um mistério para o homem,
haverá
poesia!
Enquanto se
sinta que se ri a alma,
sem que os
lábios se riam,
enquanto se
chore, sem que o pranto acuda
a nublar a
pupila;
enquanto o
coração e a cabeça
baralhando
prossigam,
enquanto
haja esperanças e memórias,
haverá
poesia!
Enquanto
haja olhos que reflitam
outros olhos
que os mirem,
enquanto
responda o lábio suspirando
ao lábio que
suspira,
enquanto
sentir-se possam em um beijo
duas almas
confundidas,
enquanto
exista uma mulher formosa,
haverá
poesia!
X
Os
invisíveis átomos do ar
ao redor
palpitam e se inflamam,
o céu
desfaz-se em raios de ouro,
a terra se
estremece alvoroçada,
ouço
flutuando em ondas de harmonias
rumor de beijos
e bater de asas,
minhas
pálpebras se fecham ... Que sucede?
É o amor que
passa!
•
Gustavo
Adolfo Bécquer nasceu em 17 de fevereiro de 1836, em Sevilha. É considerado uma figura das mais importantes do romantismo espanhol. Sua obra resume-se a um volume de poemas publicado com o título de Rimas, um conjunto de textos em prosa, Lendas, e dois pequenos conjuntos de ensaios redigidos sob a forma epistolar, "Desde mi celda" e "Cartas literarias a una mujer". Teve uma vida
breve: morreu em Madrid, sem
completar trinta e cinco anos de idade, em 22 de dezembro de 1870.
* Traduções de Márcia Sirotheau. Poemas publicados inicialmente no site do Antonio Miranda.
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