quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Dois poemas de Gustavo Adolfo Bécquer



IV

Não digais que esgotado seu tesouro,
de assuntos falta, emudeceu a lira;
poderá não haver poetas; mas sempre
haverá poesia.

Enquanto as ondas da luz ao beijo
palpitem acesas,
enquanto o sol as desgarradas nuvens
de fogo e ouro vista,
enquanto o ar em seu regaço leve
perfumes e harmonias,
enquanto haja no mundo primavera,
haverá poesia!

Enquanto a ciência a descobrir não alcance
as fontes da vida,
e no mar ou no céu haja um abismo
que ao cálculo resista,
enquanto a humanidade sempre avançando
não saiba para onde caminha,
enquanto haja um mistério para o homem,
haverá poesia!

Enquanto se sinta que se ri a alma,
sem que os lábios se riam,
enquanto se chore, sem que o pranto acuda
a nublar a pupila;
enquanto o coração e a cabeça
baralhando prossigam,
enquanto haja esperanças e memórias,
haverá poesia!

Enquanto haja olhos que reflitam
outros olhos que os mirem,
enquanto responda o lábio suspirando
ao lábio que suspira,
enquanto sentir-se possam em um beijo
duas almas confundidas,
enquanto exista uma mulher formosa,
haverá poesia!


X

Os invisíveis átomos do ar
ao redor palpitam e se inflamam,
o céu desfaz-se em raios de ouro,
a terra se estremece alvoroçada,
ouço flutuando em ondas de harmonias
rumor de beijos e bater de asas,
minhas pálpebras se fecham ... Que sucede?
É o amor que passa!

Gustavo Adolfo Bécquer nasceu em 17 de fevereiro de 1836, em Sevilha. É considerado uma figura das mais importantes do romantismo espanhol. Sua obra resume-se a um volume de poemas publicado com o título de Rimas, um conjunto de textos em prosa, Lendas, e dois pequenos conjuntos de ensaios redigidos sob a forma epistolar, "Desde mi celda" e "Cartas literarias a una mujer". Teve uma vida breve: morreu em Madrid, sem completar trinta e cinco anos de idade, em 22 de dezembro de 1870. 


* Traduções de Márcia Sirotheau. Poemas publicados inicialmente no site do Antonio Miranda.
  


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