César Paternosto. Confluence 5, 1998. |
LEGE ARTIS
I
a beleza tem
leis
que as
palavras apagam
quando
grafam seu gênesis
no princípio
da página
e revelam
que o belo
surge brusco
e sozinho
como sonho
ou delírio
na pupila da
linha
(não há luz
que construa
nem engenho
que gere
a sua flor
na brancura
insondável
do cérebro
onde pétalas
lusas
ditam versos
inéditos)
ela anula a
estrutura
cinde a lira
do logos
parte o
fêmur do número
ri do rosto
de Apolo
e na mão do
arquiteto
crava o
da(r)do do acaso
quando quer,
como quer
a si tudo
submete
tem um trono
no caos
outro sólio
na ordem
reino em
branco do arcano
onde
incógnita impera
às vogais,
consoantes
dando timbre
e mistério
II
a beleza tem
leis
que o poeta
obedece
feito cego
refém
de suas
hostes secretas
as safiras da
forma
ele pensa
que amolda
que lapida,
que pole
ou colares
concebe
mas as
pedras precisas
são geradas
por ela
ruge azul e
se insere
no momento
que escolhe
sob o molde
que elege
pressionando
sua mente
a cingir
cada verso
da maneira
que pede
advém do
inconsciente
que antecede
a palavra
e em
riquezas excede
as jazidas
da fala
um silêncio
que ao léxico
alimenta e
revela
hermertiza e
esclarece
ou destrói,
desespera
luta eterna
do ser
contra o som
e o alfabeto
contra a
arte que o diz
sem contudo
expressá-lo
III
a beleza tem
leis
que o poeta
ignora
apesar de contê-las
na extensão de
sua obra
linha a
linha reflete
harmoniosa
herméticas
de suas
luzes simétricas
que jamais
entrevê
mas cintilam
no avesso
do céu negro
que versa
lê de luas
ilógicas
raios presos
nas letras
tão sutis
que velozes
somem quando
aparecem
lê de
estrelas o eco
sob a trevas
fonéticas
e por todo
poema
em discurso
de eclipse
lê o zênite
líquido
do vocábulo
impresso
mas em
língua ilegível
– um dialeto
do nada –
que reflete o
invisível
escrevendo o
que apaga
lê a lei do
silêncio
no limite da
lauda:
a poesia
começa
onde o verbo
acaba
* A partir
da Revista Brasileira, jan-mar. 2015, ano IV, n.82, p. 218-220. Adriano Wintter tem poemas publicados na 6ª edição do caderno-revista 7faces, leia aqui.
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