AL-GHARB
Pelo lagar da noite
Estremecem as amendoeiras
Estremecem as amendoeiras
Corre no ar um tropel furtivo
Seus panos de azeite
Seus panos de azeite
E madeixas de sangue na corola
Das mulheres
Das mulheres
Ela só lívida de azul e oiro
Ave do mundo
Ave do mundo
E a mãe diurna
Boca a boca multiplicada.
Boca a boca multiplicada.
LENDO JORGE DE SENA
"Que tudo
seja como outrora eu vi:
Uma figura
ao longe recortada."
Jorge de
Sena, "Sete sonetos da visão perpétua"
porque
soberano Amor me ronda
e nos rios o
ossário dos meses
em gestação
é que vagueio
na ancorada
nau das canções de Babel e Sião
hipótese da
pedra com sílabas de colmo
e o vento
por irmão
este é o
campo das regadas areias
onde Heitor
apodreceu
que uma
sepultura em Creta acolherá
dos deuses o
corpo que lhe morreu
não eu
hausto na ilha errante
da
entumecida voz à míngua
dos seminais
lugares da esperança
e porque
senão de angústia nos armamos
da exposta
lança que é a língua
como se casa
houvera desnudamos
extreme
peregrinação nenhuma
de visão
mais torturada
"uma figura
ao longe recortada".
•
Luís Carlos Patraquim nasceu em Maputo em 1953. É considerado por críticos e especialistas como um
dos maiores poetas moçambicanos vivos. Teve papel importante e
inovador na literatura, cinema e jornalismo de Moçambique. Sua primeira obra,
Monção (1980), demarcou o início de uma outra
estação literária em Moçambique, até então marcada pela poesia panfletária. A
nova vertente passou a aliar a reflexão aos sentidos, construindo poemas
dotados da capacidade de enaltecer a vida, acreditar no amor, despertar os
desejos, desbravar o espaço onírico, repensar a própria poesia. A vasta obra poética é dividida com os trabalhos de roteirista, e jornalista. Além da obra de 1980, é autor de títulos como A inadiável Viagem (1985), Lidemburgo Blues (1997) e Pneuma (2008). Foi galardoado com o
Prêmio Nacional de Poesia de Moçambique, em 1995, quando já vivia em Portugal, para onde se mudou em 1986.
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