INTERLUNAR
Entre nuvens cruéis de púrpura e gerânio,
rubro como, de sangue, um hoplita messênio
o Sol, vencido, desce o planalto de urânio
do ocaso, na mudez de um recolhido essênio...
Veloz como um corcel, voando num mito hircânio,
tremente, esvai-se a luz no leve oxigênio
da tarde, que me evoca os olhos de Estefânio
Mallarmé, sob a unção da tristeza e do gênio!
O ônix das sombras cresce ao trágico declínio
do dia que, a lembrar piratas no mar Jônio,
põe, no ocaso, clarões vermelhos de assassínio...
Vem a noite e, lembrando os Montes do Infortúnio,
vara o estranho solar da Morte e do Demônio
com as torres medievais as sombras do Interlúnio...
TELA DO
NORTE
No estirão,
percutindo os chifres, a boiada
monótona
desliza; ondulando, a poeira,
em fulvas
espirais, cobre toda a chapada
em cujos
poentes o sol põe uns tons de fogueira.
Baba de sede
e muge a leva; triturada
sob as patas
dos bois a relva toda cheira!
Boiando,
corta o ar a mórbida toada
do guia que,
de pé, palmilha à cabeceira...
Nos flancos
da boiada, aos recurvos galões
as éguas,
vão tocando a reses fugitivas
os
vaqueiros, com o sol nas pontas dos ferrões...
E,
do gado o tropel, com as asas derreadas
quase
riscando o chão, que o sol calcina, esquivas,
arrancam
coleando as emas assustadas...
•
José Américo
Augusto Olímpio Cavalcanti dos Albuquerque Maranhão Sobrinho nasceu em
Barra do Corda, interior do Maranhão, em 25 de dezembro de 1879, e morreu ainda
jovem, em Manaus, no mesmo dia em que completava 36 anos. Nesse breve espaço de
tempo, encarnou como poucos a figura trágica do poeta dominado por suas
angústias existenciais. Fundador com Antonio Lobo, I. Xavier de Carvalho e Corrêa de
Araújo, entre outros, do movimento de renovação literária denominado "Os novos atenienses", que em fins do século XIX e início do século XX sacudiu o
meio intelectual de São Luís com ideias e conceitos vanguardistas, Maranhão
Sobrinho foi o mais singular poeta de sua geração. Sem dispor de recursos
financeiros, publicou seus trabalhos com grande dificuldade; três livros
ao todo, com circulação restrita à província. Papéis velhos... roídos pela traça do símbolo (1908);
Estatuetas (1909); Vitórias-Régias (1911).
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