sábado, 19 de janeiro de 2013

3 poemas de Ronald de Carvalho


Anoitece...

Anoitece...
Venho sofrer contigo a hora dolente que erra,
Sob a lâmpada amiga, entre um vaso com rosas,
Um festão de jasmins, e a penumbra que desce...
Hora em que há mais distância e mágoa pela terra;
Quando, sobre os chorões e as águas silenciosas,
Redonda, a lua calma e sutil, aparece...

O rumor de uma voz sobe no espaço, ecoando,
Mais um dia se foi, menos uma ilusão!
E assim corre, igualmente, a ampulheta da vida.
Senhor! depois de mim, como folhas em bando,
Num crepúsculo triste, outros homens virão
Para recomeçar a rota interrompida,
E a amargura sem fim de um mesmo sonho vão...
 
Nos dormentes jardins bolem asas incautas,
Sobre os campos a bruma ondeia, devagar.
Estremecem no céu estrelas sonolentas
E os rebanhos, que vão na neblina lunar,
Agitam molemente, ao longe, as curvas lentas
Das estradas de esmalte, ao rudo som das frautas.
 
Anoitece...
Tremula ainda, no poente, a luz de alguns clarões,
E, enquanto sobre o meu teu olhar adormece,
Entre o perfil sombrio e vago dos chorões,
Redonda, a lua calma e distante, aparece...



CARVALHO, Ronalde. Anoitece. In: MURICY, Andrade. Panorama do movimento simbolista brasileiro. 2.ed. Brasília: INL, 1973, p.1056.


Épura

Geometrias, imaginações destes caminhos
da minha terra!
Curvas de trilhas,
triângulos de asas,
bolas de cor...

Círculos de sombras agachadas entre as árvores,
cilindros de troncos embebidos na luz.

Geometrias, imaginações destes caminhos
da minha terra!

Melancolicamente, nesta alegria geométrica,
pingando bilhas polidas,
o leque das bananeiras abana o ar da manhã...


CARVALHO, Ronald de. Poesia e prosa. Org. Peregrino Júnior. 2.ed. Rio de Janeiro: Agir, 1977.


Vento noturno

Volúpia do vento noturno,
do vento que vem das montanhas e das ondas,
do vento que espalha no espaço o cheiro das resinas,
a exalação da maresia e do mato virgem,
das mangas maduras, das magnólias e das laranjas,
dos lírios do brejo e das praias úmidas.

Volúpia do vento noturno nas noites tropicais,
quando o brilho das estrelas é fixo, duro,
quando sobe da terra um hálito quente, abafado,

e a folhagem lustrosa lembra o aço polido.
Volúpia do vento morno do verão,
carregado de odores excitantes,
como um corpo de mulher adolescente,
de mulher que espera o momento do amor...

Volúpia do vento noturno em minha terra natal!


CARVALHO, Ronald de. O espelho de Ariel e poemas escolhidos. Pref. Antônio Carlos Villaça. Rio de Janeiro: Nova Aguilar; Brasília: INL, 1976. p.173.

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