quarta-feira, 5 de janeiro de 2011
Um poema de Eduardo Galeano
Há uns quinze bilhões de anos, segundo afirmam os entendidos, um ovo incandescente estalou no meio do nada e deu nascimento aos céus e às estrelas e aos mundos.
Há uns quatro mil ou quatro mil e quinhentos milhões de anos (ano mais, ano menos) a primeira célula bebeu o caldo do mar e achou bom, e se duplicou para ter a quem convidar para tomar um trago.
Há uns dois milhões de anos, a mulher e o homem, quase macacos, ergueram-se sobre suas patas, e ergueram os braços, e se abraçaram... e se penetraram... e pela primeira vez tiveram a alegria e o pânico de ver-se cara a cara enquanto praticavam o ato.
Há uns quatrocentos e cinqüenta mil anos a mulher e o homem friccionaram duas pedras e acenderam o primeiro fogo que os ajudou a defenderem-se do inverno.
Há uns trezentos mil anos a mulher e o homem se disseram as primeiras palavras e acreditaram que poderiam se entender. E neste ponto estamos... e neste ponto estamos até agora: querendo ser dois, mortos de medo, mortos de frio, buscando palavras.
* Tradução de Mariana Rawet.