Teus pés
toco na sombra, na luz as tuas mãos
e no voo me
guiam os teus olhos de águia
Matilde, com
os beijos que aprendi de tua boca
meus lábios
aprenderam a conhecer o fogo.
Oh pernas
herdadas da absoluta avena
cereal,
estendida a batalha
coração de
campina
quando em
teus seios pus minhas orelhas
meu sangue*
propagou tua sílaba araucana
* trecho ilegível
E os cavalos onde estão?
De tanto
viver e morrer
as pessoas
bem-educadas
de tanto
dizer bons-dias,
dizer adeus
com parcimônia.
não se
despediram a tempo
dos vegetais
cavalos
Eu montei
uma gota de chuva
eu montei
uma gota d'água
mas tão
pequeno era então
que me
escorreguei na terra
e perdia a
montaria
entre
raízes, ferraduras
agora o
homem está ocupado
e não mira o
bosque profundo
já não
investiga a folhagem
nem lhe caem
do céu as folhas
está ocupado
o homem agora
ocupado em
cavar sua cova.
Há que ver o
que é o silêncio
nos entornos
de Valdivia
por isso não
conhecerá
a comunidade
do subsolo
a comunhão
das raízes
pois estes
falecidos mortos
morreram
antes de morrer.
No entanto,
por meu juízo
o coração é
uma folha
o vento a
faz palpitar
•
Pablo Neruda nasceu a 12 de julho
de 1904 em Parral. Estudou Pedagogia e Francês na Universidade do Chile,
período quando começa a se apresentar como escritor: data de então o terceiro
lugar num concurso do jornal A Manhã, o primeiro lugar na Festa da
Primavera e as primeiras publicações — Crepusculário sai em 1923. É quando
se interessa também pelas vanguardas, influência que se reparará em três
plaquetes publicadas na década seguinte: O habitante e sua esperança, Anéis
e Tentativa do homem infinito. Torna-se diplomata e estabelece relações com
nomes da literatura ao redor do mundo: Federico García Lorca, Rafael Alberti,
Vinicius de Moraes, entre outros. Dos livros que publicou, destaca-se Nasci
para nascer. Em 1971, torna-se o segundo poeta do seu país a receber o
Prêmio Nobel de Literatura. Morreu em Santiago a 23 de setembro de 1973.
* Tradução de Alexei Bueno
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