quarta-feira, 1 de junho de 2016

Quatro poemas de Stefan George



INICIAÇÃO

São as horas paradas
Cada uma do ano atalho
Em hera entrelaçadas
Cobertas de esplêndido orvalho.

É a fala infantil
Que sua voz na flauta ensaia
A réplica sutil
Coro de mata e vento e praia.

É a primeira pena
Pois o sonho em palavras mente
E a longe altiva rena
Confinada tomba demente.

É o inicial mosto
E saudade é só submissão
O Maldito indisposto
Que inspira comiseração.

É ainda a Camena
Que hesita pálida e se insurge
Com os seus sons acena
E assusta-se com o que surge...

Tal qual uva azedia
Que lenta perfuma e colora
Da folhagem sombria
Se alça a cotovia na aurora.


SENHOR DA ILHA

Pescadores contam que ao sul
Numa ilha rica em canela e azeite
E preciosas pedras cintilantes na areia
Havia uma ave que ao sol podia
Desfolhar as copas de árvores gigantes
Quando alçava as asas
Com as cores dos humores dos caracóis de Tyrer
Mergulhava em impressionante voo
Assemelhando-se a uma escura nuvem.
De dia embrenhava-se na mata
Ressurgia na praia ao anoitecer
Na brisa fria recendendo sal e alga
Seu canto suave seduzia golfinhos
E os conduzia para o mar que luzia
Coberto de penas douradas.
Assim viveu desde os primórdios
Apenas náufragos a viram.
Quanto no horizonte surgiram
As velas da primeira armada
Alçou-se aos céus numa revoada
A todo o éden deu adeus aflita
E debatendo as imensas asas
Sucumbiu com o chiado abafado da dor infinita.

*

A palavra ilude e some
Só a canção a alma anima
Se ainda não sinto a rima
Que essa falta não assome.

Como as crianças distantes
Deixa-me livre cantar
Nos salões não quero estar
Nesse mundo dos gigantes.

Zombes desse meu despeito!
Um dia confessarei
Que em meus sonhos te abracei
E já trago-te no peito.


CANÇÃO DO ANÃO

I
Pequenas aves piam
Pequenas flores ciam
Seus sinos ciciam.

No prado estrelado
Pasta pequeno gato
De pelo delicado.

Pequeninos se inclinam
E no giro se alucinam –
O anão já atinam?

II
De meu palácio eu chego
Para a dança infantil
Irá alguém gentil
Conceder-me aconchego?

Deixai que me antecipe
Do trono compartilho
Sou o infalível filho
Dos anões o príncipe.

* Tradução de Eduardo de Campos Valares



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