OS MUDOS
Esses
suspiros que os homens
soltam quando
passam por uma mulher na rua
ou nas
escadas do metrô
a fim de lhe
dizer que é uma fêmea
pois assim
sentem suas carnes,
são talvez espécie
de som,
canção muito
feia, feia mesmo, sussurrada
por um pássaro
de língua serrada
mas feita
para música?
Ou são
grunhidos
de surdos-mudos
encurralados numa sala que
aos poucos
se enche de fumaça?
Talvez as
duas coisas.
Tais homens
parecem que
só sabem
soltar tais sussurros,
no entanto
uma mulher, apesar de si mesma,
sabe que
lhes chama atenção:
se ela não tivesse
graça
passariam
por ela em silêncio:
logo, não é
só porque ela seja
um buraco
quente. É uma palavra
em língua
sofrida, longe de ser
primitiva
nem primária;
língua
prenhe, doentia, senilizada,
em
decrepitude. Ela deseja
desfazer-se
do sussurro, repug-
nada, mas não
consegue,
o sussurro
prossegue zurrando em seus ouvidos,
muda o ritmo
de seus passos,
os cartazes
rasgados em corredores que ecoam,
verbalizam-no,
ele
se estremece
e range à chegada do trem.
O pulso dela
sobriamente
acelerava-se,
mas os vagões
param
estridentes
enquanto sua
compreensão
prossegue
transladando
“Vida após
vida após vida prossegue
sem poesia
sem decência
sem amor”.
* Tradução de Ary Gonzalez
Galvão
A QUEIXA DE ADÃO
Alguns,
não importa o que lhes é dado,
ainda querem a lua.
O pão, o sal,
carne branca ou vermelha,
ainda dão fome.
O leito nupcial
E o berço
ainda cruzam braços.
Recebem terras,
seu próprio chão sob os pés,
e ainda tomam estradas.
E água: escava-se poço mais fundo,
não é fundo bastante
para beber a lua.
não importa o que lhes é dado,
ainda querem a lua.
O pão, o sal,
carne branca ou vermelha,
ainda dão fome.
O leito nupcial
E o berço
ainda cruzam braços.
Recebem terras,
seu próprio chão sob os pés,
e ainda tomam estradas.
E água: escava-se poço mais fundo,
não é fundo bastante
para beber a lua.
* Tradução Ruy Vasconcelos
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