ELA
Ela dava
dois passos para frente
Dava dois
passos para trás
O primeiro
passo dizia bom dia senhor
O segundo
passo dizia bom dia senhora
E os outros
diziam como está a família
Hoje é um
dia bonito como uma pomba no céu
Ela trajava
uma blusa ardente
Ela tinha
olhos de apaziguadora de mares
Ela havia escondido
um sonho num armário escuro
Ela havia encontrado
um morto em meio de sua cabeça
Quando ela chegava
deixava uma parte mais bonita muito longe
Quando ela
ia algo se formava no horizonte para esperá-la
Em seus
olhares estavam feridas e sangravam sobre a colina
Tinha os
seios abertos e cantava as trevas de sua idade
Era bonita como
um céu sob uma pomba
Tinha uma boca
de aço
E uma
bandeira mortal desenhada entre os lábios
Ria como o
mar que sente carbonos em seu ventre
Como o mar
quando a lua se olha afogar-se
Como o mar
que mordeu todas as praias
O mar que
transborda e cai no vazio nos tempos de abundância
Quando as
estrelas arrulham sobre nossas cabeças
Antes que o
evento norte abra seus olhos
Era bonita
em seus horizontes de ossos
Com sua blusa
ardente e seus olhares de árvore fatigada
Como o céu a
cavalo sobre as pombas.
CAMINHO
Um cigarro
vazio
Ao longo do caminho
Desfolhei meus
dedos
E jamais
olhar para trás
Minha cabeleira
E uma fumaça
deste cigarro
Aquela luz
me conduzia
Todos os pássaros
sem asas
Em meus
ombros cantaram
Mas meu coração
cansado
Morreu no
último ninho
Chove sobre
o caminho
E vou buscando
o lugar
onde minhas
lágrimas caíram.
DIAS E NOITES TE BUSQUEI
Dias e
noites te busquei
Sem encontrar
o lugar onde cantas
Te busquei
pelo tempo acima e pelo rio abaixo
Te perdestes
entre as lágrimas
Noites e
noites te busquei
Sem encontrar
o lugar onde choras
Porque eu
sei que estás chorando
Basta-me com
olhar-me num espelho
Para saber
que estás chorando e me chorastes
Só tu salvas
o pranto
E de mendigo
escuro
O fazes rei coroado
por tua mão
HORAS
A aldeia
Um trem
parado sobre a planície
Em cada poça
dormem estrelas
surdas
E a água
tremula
Cortinados
ao vento
A noite suspensa
no bosque
No
campanário florido
Uma goteira
viva
Sangra as estrelas
De quando em
quando
As horas
maduras
Caem sobre a vida
•
Vicente Huidobro nasceu em 10 de janeiro de 1893 em Santiago do Chile. Foi um
poeta de vanguarda muito influente na poesia do século XX e considerado pelos chilenos
um dos maiores poetas da literatura em seu país e da América Latina; por
outros, figura como um dos quatro grandes poetas do Chile – com Pablo Neruda,
De Rokha e Gabriela Mistral. Nome importante de um movimento que chamou de Criacionismo.
Deixou extensa obra, da qual se destacam Horizon Carré (1917), Tour
Eiffel (1918), Saisons Choisies (1921)
e Poemas árticos (1918). O poeta morreu em 2 de janeiro de 1948 em Cartagena, Chile.
* Traduções
de Pedro Fernandes de Oliveira Neto.
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