A branca solidão
Sob a calma do sono,
Calma lunar de luminosa seda,
A noite,
Como se fosse
O corpo branco do silêncio,
Docemente na imensidão se deita.
E desnastra
A cabeleira
Em prodigiosa folhagem
De alamedas.
Nada vive, menos o olho
De relógio na torre tétrica,
Aprofundando inutilmente o infinito
Como um orifício aberto na areia.
O infinito,
Rodado pelas rodas
Dos relógios,
Como um carro que nunca chega.
A Lua cava um branco abismo
De quietude, em cujo côncavo
As coisas são cadáveres
E as sombras vivem como ideias.
E a gente pasma de tão próxima
Que naquela brancura se acha a morte.
De tão bonito que é o mundo
Possuído pela antiguidade da lua cheia,
E a ânsia tristíssima de ser amado
No coração doloroso estremece.
* Tradução de Aurélio Buarque de Holanda
A última careta
A miséria ri. Com sórdida costeleta
seu cão de guarda lhe regala um festim.
Em suas funambulescas calças vai um poeta,
e em seu casaco o órfão que tem por Delfim.
A fome é seu pandeiro, a lua sua moeda
e o tango vagabundo seu pai-nosso. Crina
de leão, sua coroa. Sua inutilizada escopeta
de mercenário impávido sua uma fugosa fuligem.
Vai em dominó de farrapos, zumbe sua copla irônica,
por véu lhe empresta seu lenço a Verônica.
Seu corpo, de tão chagado, parece um horto em flor.
E sob a ignomínia de tão sinistra máscara
Cristo ensina à noite sua formidável máscara
de cabelos terríveis, de sangue e pavor.
* Tradução de Floriano Martins
Sob a calma do sono,
Calma lunar de luminosa seda,
A noite,
Como se fosse
O corpo branco do silêncio,
Docemente na imensidão se deita.
E desnastra
A cabeleira
Em prodigiosa folhagem
De alamedas.
Nada vive, menos o olho
De relógio na torre tétrica,
Aprofundando inutilmente o infinito
Como um orifício aberto na areia.
O infinito,
Rodado pelas rodas
Dos relógios,
Como um carro que nunca chega.
A Lua cava um branco abismo
De quietude, em cujo côncavo
As coisas são cadáveres
E as sombras vivem como ideias.
E a gente pasma de tão próxima
Que naquela brancura se acha a morte.
De tão bonito que é o mundo
Possuído pela antiguidade da lua cheia,
E a ânsia tristíssima de ser amado
No coração doloroso estremece.
* Tradução de Aurélio Buarque de Holanda
A última careta
A miséria ri. Com sórdida costeleta
seu cão de guarda lhe regala um festim.
Em suas funambulescas calças vai um poeta,
e em seu casaco o órfão que tem por Delfim.
A fome é seu pandeiro, a lua sua moeda
e o tango vagabundo seu pai-nosso. Crina
de leão, sua coroa. Sua inutilizada escopeta
de mercenário impávido sua uma fugosa fuligem.
Vai em dominó de farrapos, zumbe sua copla irônica,
por véu lhe empresta seu lenço a Verônica.
Seu corpo, de tão chagado, parece um horto em flor.
E sob a ignomínia de tão sinistra máscara
Cristo ensina à noite sua formidável máscara
de cabelos terríveis, de sangue e pavor.
* Tradução de Floriano Martins
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Leopoldo Lugones nasceu no dia 13 de junho de 1874, na Villa de María del Río Seco, tradicional cidade da província de Córdoba. Começou a escrever profissionalmente no jornal La Montaña e a partir de então se tornou um dos expoentes do modernismo em seu país. Escreveu prosa (romance e contos) e poesia. Deste último gênero destacam-se Las montañas del oro, o livro de estreia, marcadamente simbolista, El libro fiel e El libro delas paisajes. Suicidou-se ingerindo cianureto no dia 18 de fevereiro de 1938 no balneário de El Tigre, próximo a Buenos Aires.
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