POETA
de produzir entusiasmo
e é preciso que os versos sejam verdadeiros
na vida dos poetas
como a tua mão erguida
sobre os anos futuros
quando o próprio bronze das estátuas se cobrir
do verdete do esquecimento
e das urtigas
entre as ruínas de um passado morto
e as pequenas plaquetes dos sentimentos pobres
dos líricos delírios
das doidas metáforas sem sentido
louvadas pela crítica
só tiverem o arqueológico encanto
de um cabelo de Ofélia.
os teus versos estarão na primeira fila dos pioneiros
cobertos de cicatrizes
porque fizeram todo o caminho do tempo
multiplicados por milhões de vozes
pela alta potência dos alto-falantes
como uma bandeira erguida
sobre os anos futuros.
Quem marca uma fronteira
àquela nuvem
a asa que é a sua sombra
onde mora?
calam-se as palavras
mas ninguém te cala
pensamento.
não germines
ao fruto dela
que o não seja?
com algemas
mas ninguém te amarra
pensamento.
que não nasça
ao sol que é a sua fonte
que não brilhe?
com tapumes
mas ninguém te cega
pensamento.
é impossível
à lembrança que é seu laço
que o não seja?
na distância
ninguém te roubará
meu pensamento.
•
Joaquim Namorado nasceu a 30 de junho de 1914, em Alter do Chão, Alentejo, Portugal. Sua presença na cena literária em país está circunscrita no âmbito do Neorrealismo. Colaborou com as revistas Seara nova, Sol nascente e Vértice ― importantes periódicos os autores desta estética. Como poeta, estreou com Aviso à navegação (1941); este livro foi seguido de Incomodidade (1945) e A poesia necessária (1966). Morreu em Coimbra a 29 de dezembro de 1986.
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