NATAL DUM POETA
Em certo reino, à esquina do
planeta,
Onde nasceram meus Avós, meus Pais,
Há quatro lustres, viu a luz um poeta
Que melhor fora não a ver jamais.
Mal despontava para a vida
inquieta,
Logo ao nascer, mataram-lhe os ideais,
A falsa-fé, numa traição abjecta,
Como os bandidos nas estradas reais!
E, embora eu seja descendente, um
ramo
Dessa árvore de Heróis que, entre perigos
E guerras, se esforçaram pelo ideal:
Nada me importa, Pais! Seja meu
amo
O Carlos ou Zé da Tereza... Amigos,
Que desgraça nascer em Portugal!
Coimbra, 1889.
CONDE
Na praia lá da Boa Nova, um dia,
Edifiquei (foi esse um grande mal)
Torreão de glória, o que é a fantasia,
Todo de lápis-lazúli e coral!
Naquelas redondezas, não havia
Quem se gabasse dum domínio igual:
Oh o Torreão de glória! Parecia
O território dum Senhor feudal!
Um dia, não sei quando, num sei
donde,
Um vento seco de tortura e spleen
Deitou por terra, ao pó que tudo esconde,
O meu condado, o meu condado, sim!
Porque eu já foi um poderoso Conde,
Naquela idade em que se é conde assim...
Porto, 1887.
Ó VIRGENS!
Ó virgens que passais, ao sol-poente,
Pelas estradas ermas, a cantar!
Eu quero ouvir uma canção ardente
Que me transporte ao meu perdido lar...
Cantai-me, nessa voz onipotente,
O sol que tomba, aureolando o mar,
A fartura da seara reluzente,
O vinho, a graça, a formosura, o luar!
Cantai! Cantai as límpidas
cantigas!
Das ruínas do meu lar desterrai
Todas aquelas ilusões antigas
Que eu vi morrer num sonho, como
um ai...
Ó suaves e frescas raparigas,
Adormecei-me nessa voz... Cantai!
Porto, 1886.
À LUZ DA LUA
Íamos sós pela floresta amiga,
Onde em perfumes o luar se evola,
Olhando os céus, modesta rapariga!
Como as crianças ao sair da escola.
Em teus olhos dormentes de fadiga,
Meio cerrados como o olhar da rola,
Eu ia lendo essa balada antiga
Duns noivos mortos ao cingir da estola...
A Lua-a-Branca, que é tua avozinha,
Cobria com os seus os teus cabelos
E dava-te um aspeto de velhinha!
Que linda eras, o luar que o diga!
E eu compondo estes versos, tu ao lê-los
E ambos cismando na floresta amiga...
Porto, 1884.
Onde nasceram meus Avós, meus Pais,
Há quatro lustres, viu a luz um poeta
Que melhor fora não a ver jamais.
Logo ao nascer, mataram-lhe os ideais,
A falsa-fé, numa traição abjecta,
Como os bandidos nas estradas reais!
Dessa árvore de Heróis que, entre perigos
E guerras, se esforçaram pelo ideal:
O Carlos ou Zé da Tereza... Amigos,
Que desgraça nascer em Portugal!
Edifiquei (foi esse um grande mal)
Torreão de glória, o que é a fantasia,
Todo de lápis-lazúli e coral!
Quem se gabasse dum domínio igual:
Oh o Torreão de glória! Parecia
O território dum Senhor feudal!
Um vento seco de tortura e spleen
Deitou por terra, ao pó que tudo esconde,
Porque eu já foi um poderoso Conde,
Naquela idade em que se é conde assim...
Pelas estradas ermas, a cantar!
Eu quero ouvir uma canção ardente
Que me transporte ao meu perdido lar...
O sol que tomba, aureolando o mar,
A fartura da seara reluzente,
O vinho, a graça, a formosura, o luar!
Das ruínas do meu lar desterrai
Todas aquelas ilusões antigas
Ó suaves e frescas raparigas,
Adormecei-me nessa voz... Cantai!
Onde em perfumes o luar se evola,
Olhando os céus, modesta rapariga!
Como as crianças ao sair da escola.
Meio cerrados como o olhar da rola,
Eu ia lendo essa balada antiga
Duns noivos mortos ao cingir da estola...
Cobria com os seus os teus cabelos
E dava-te um aspeto de velhinha!
E eu compondo estes versos, tu ao lê-los
E ambos cismando na floresta amiga...
•
António Nobre nasceu a 16 de
agosto de 1867 no Porto. Sua obra está situada entre os limites do
ultrarromantismo ao decadentismo foi influente nas primeiras variantes poéticas
que culminariam na formação do modernismo português. Sob o epíteto de o
livro mais triste que há em Portugal publicou um só título em Paris, Só
(1892). Depois de sua morte, a 16 de agosto de 1867 na Foz Douro, ainda veio à
luz as antologias Despedidas (1895-1899) e Primeiros versos
(1882-1899).
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