quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Dois poemas de Valentim Magalhães

 
TORTURA

A Adelino Fontoura
 

Ante a mesquita d’áureos minaretes
Açoitam dois telingas a traidora;
As vergastas, sutis como floretes,
Sibilam sobre a carne tentadora.
 
À vibração das varas, estremecem
Seus níveos membros firmes, delicados,
E, nos espasmos do sofrer, parecem
Das contorções do gozo eletrizados.
 
Geme aos golpes, que as carnes lhe retalham,
E aberta a rósea boca, os olhos belos
Pérolas vertem, que seu peito orvalham;
 
Dobram-se as curvas, soltam-se os cabelos,
E do alvo colo, amargurado e exangue,
— Como esparsos rubis — goteja o sangue.
 
 
MEDALHÕES DE ATRIZES

Chloé púbere apenas, fresca aurora
De mulher; linhas nobres de palmeira
Moça, em que a seiva exuberante aflora
E que agita as espátulas, faceira.

Nos olhos a alegria sobranceira
De voar, azas abertas, vida em fora.
Na voz tem da menina a derradeira
Gama e as primeiras notas da senhora.

Nervos cruéis, de velho stradivarius,
Em que uma herança de paixões ressalta,
Torturando-os, febris, tumultuários.

Quando surgiu, radiosa, no proscênio,
Apagaram-se as luzes da ribalta,
E a sala encheu-se da manhã de um gênio.
 
Valentim Magalhães nasceu a 16 de janeiro de 1859 no Rio de Janeiro. É autor de vasta obra, com produções na prosa e na poesia. Machado de Assis disse sobre o poeta — o que se repetiu variamente na crítica, vide Silvio Romero — que “as ideias dele são geralmente de empréstimo; e o poeta não as realça por modo de ver próprio novo.” Integrado ao fazer parnasiano, escreveu livros como Cantos e lutas e Rimário. Formado em Direito na faculdade de São Paulo, onde colaborou com vários periódicos desta cidade; no retorno ao Rio, dirigiu o jornal A Semana, no qual levou adiante o tratamento de propagandista da abolição e pela República. Atuou na fundação da Academia Brasileira de Letras. Morreu a 17 de maio de 1903.
 
 

Nenhum comentário:

Postar um comentário