domingo, 28 de novembro de 2010

Dois poemas de Adolfo Caminha

NO BANHO

Ninfas do bosque, Náiades formosas,
Sátiros, Faunos, vinde vê-la agora,
Nua, no banho, esta ideal senhora,
Que em beleza e frescura excede as rosas.

Vinde todos depressa!... Ei-la que cora,
Ei-la que solta as tranças graciosas
Sobre as espáduas níveas, capitosas...
Ei-la que treme à loura luz da aurora...

Tinge-se o céu de cores purpurinas,
O sol desponta; as tímidas boninas
Mostram à luz os cálices dourados.

Vede-as, Ninfas, agora: os nacarados
Lábios, os seios túmidos, nevados,
Segredam coisas ideais, divinas.


A CRIANÇA SUICIDA

Pobre criança!... Pobre... Um pensamento impuro
apagou-te da mente os sonhos infantis...
Quanta dor! quanto amor no teu semblante puro
ao ver-te só no mundo entregue aos homens vis!...

E um dia a sociedade, esse vampiro enorme,
que o sangue chupa ao justo e poupa a tirania,
essa ave negra, viu-te, arroxeado e informe,
o corpo de criança, a alma... já não via!...

Como era triste o quadro! A boca se entreabria
como s’inda quisesse um ai! Soltar ao mundo.
A negra multidão te olhava e parecia
tocada de pavor e de um ódio profundo!

Via-se em cada rosto um riso de ironia,
como desafiando os céus e o mundo inteiro.
Uma criança loira os lábios entreabria
e apontava sorrindo o corpo do caixeiro!...
E o corpo, já sem vida, o vento balouçava!
Era como uma lâmpada sombria, negra,
alumiando o povo... A multidão sismava
e ouvia-se distante a voz da tontinegra...

Dezembro, 1885.

Adolfo Caminha nasceu em Aracati no dia 29 de maio de 1867. A vida breve não o impediu de construir uma obra significativa para a literatura brasileira. Ficou conhecido com romances como A normalista e Bom crioulo, importantes títulos para o naturalismo. Mas, sua estreia literária foi com o livro de poemas Voos incertos, único que publicou neste gênero. Morreu no Rio de Janeiro no dia 1º de janeiro de 1897.

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