quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Dois sonetos de Petrarca



Se amor não é qual é este sentimento?
Mas se é amor, por Deus, que cousa é a tal?
Se boa por que tem ação moral?
Se má por que é dão doce o seu tormento?

Se eu ardo por querer por que o lamento
Se sem querer o lamentar que val?
Ó viva morte, ó delicioso mal,
Tanto podes sem meu consentimento.

E se eu consinto sem razão pranteio.
A tão contrário vento em frágil barca,
Eu vou por alto-mar e sem governo.

É tão grave de error, de ciência é parca
Que eu mesmo não sei bem o que eu anseio
E tremo em pleno estio e ardo no inverno.

*

Vós que escutais em rimas espalhado
Desde meu peito o suspirado ardor
E que o nutria ao juvenil error
Quando era mui diverso o meu estado;

O incerto estilo por que eu ei variado
Entre a vã esperança e o vão temor,
Se vós houverdes entendido amor
Terá vossa piedade despertado.

Vejo que a todos meu amor assim
Quase sempre foi fábula somente.
E agora eu de mim mesmo me envergonho.

De minha vida vã vergonha é o fim
E o arrepender-se e o ver mui claramente
Que quanto apraz ao mundo é breve sonho.




Francesco Petrarca nasceu em Arezzo em 20 de julho de 1304. Pensador e poeta italiano considerado inventor do soneto, uma forma de poesia lírica composta de catorze versos. Sua obra é vasta e inclui ensaios acadêmicos, missivas e poesia. Duas obras suas estão entre as principais, o Cancioneiro e Triunfos.  Morreu em 19 de julho de 1374 em Arquà. 

*Tradução de Jamil Almansur Haddad.

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