Se amor não é qual é este sentimento?
Mas se é amor, por Deus, que cousa é a tal?
Se boa por que tem ação moral?
Se má por que é dão doce o seu tormento?
Se eu ardo por querer por que o lamento
Se sem querer o lamentar que val?
Ó viva morte, ó delicioso mal,
Tanto podes sem meu consentimento.
E se eu consinto sem razão pranteio.
A tão contrário vento em frágil barca,
Eu vou por alto-mar e sem governo.
É tão grave de error, de ciência é parca
Que eu mesmo não sei bem o que eu anseio
E tremo em pleno estio e ardo no inverno.
*
Vós que
escutais em rimas espalhado
Desde meu
peito o suspirado ardor
E que o
nutria ao juvenil error
Quando era
mui diverso o meu estado;
O incerto
estilo por que eu ei variado
Entre a vã
esperança e o vão temor,
Se vós
houverdes entendido amor
Terá vossa
piedade despertado.
Vejo que a
todos meu amor assim
Quase sempre
foi fábula somente.
E agora eu
de mim mesmo me envergonho.
De minha
vida vã vergonha é o fim
E o
arrepender-se e o ver mui claramente
Que quanto
apraz ao mundo é breve sonho.
•
Francesco
Petrarca nasceu em Arezzo em 20 de julho de 1304. Pensador e poeta italiano considerado
inventor do soneto, uma forma de poesia lírica composta de catorze versos. Sua
obra é vasta e inclui ensaios acadêmicos, missivas e poesia. Duas obras suas estão
entre as principais, o Cancioneiro e Triunfos. Morreu em 19 de julho de
1374 em Arquà.
*Tradução de Jamil Almansur Haddad.
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