Transforma-se o amador na cousa
Transforma-se o amador na cousa amada,
Por virtude
do muito imaginar;
Não tenho
logo mais que desejar,
Pois em mim
tenho a parte desejada.
Se nela está
minha alma transformada,
Que mais
deseja o corpo de alcançar?
Em si
somente pode descansar,
Pois consigo
tal alma está liada.
Mas esta
linda e pura semideia,
Que, como o
acidente em seu sujeito,
Assim co'a
alma minha se conforma,
Está no
pensamento como ideia;
[E] o vivo e
puro amor de que sou feito,
Como matéria
simples busca a forma.
Alma minha
gentil, que te partiste
Alma minha
gentil, que te partiste
Tão cedo
desta vida, descontente,
Repousa lá
no Céu eternamente
E viva eu cá
na terra sempre triste.
Se lá no
assento etéreo, onde subiste,
Memória
desta vida se consente,
Não te
esqueças daquele amor ardente
Que já nos
olhos meus tão puro viste.
E se vires
que pode merecer-te
Alguma cousa
a dor que me ficou
Da mágoa,
sem remédio, de perder-te,
Roga a Deus,
que teus anos encurtou,
Que tão cedo
de cá me leve a ver-te,
Quão cedo de
meus olhos te levou.
Ao desconcerto
do Mundo
Os bons vi
sempre passar
No Mundo
graves tormentos;
E pera mais
me espantar,
Os maus vi
sempre nadar
Em mar de
contentamentos.
Cuidando
alcançar assim
O bem tão
mal ordenado,
Fui mau, mas
fui castigado.
Assim que,
só pera mim,
Anda o Mundo
concertado.
•
Luís de
Camões nasceu em Lisboa possivelmente em 1524 e morreu 10 de junho de 1580. É considerado o mais importante nome do Classicismo português. Sua
obra de destaque é o poema épico Os
Lusíadas, no qual relata as navegações de Vasco da Gama na nova rota para
as Índias.
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