EUPOEMA
O lugar onde eu nasci nasceu-me
num interstício de marfim,
entre a clareza do início
e a celeuma do fim.
entre a clareza do início
e a celeuma do fim.
Eu jamais soube ler: meu olhar
de errata a penas deslinda as feias
fauces dos grifos e se refrata:
onde se lê leia-se.
fauces dos grifos e se refrata:
onde se lê leia-se.
Eu não sou quem escreve,
mas sim o que escrevo:
Algures Alguém
são ecos do enlevo.
mas sim o que escrevo:
Algures Alguém
são ecos do enlevo.
JANEIRO/FEVEREIRO
Calendário Philips 1980
Nem só a cav
idade da boca
Nem só a língua
Nem só os dentes
e os lábios
fazem a língua
Ouça
as mãos
tecendo a língua
e sua linguagem
É a língua
têxtil
O texto
que sai das
mãos
sem palavras
POEMA
Tosco dizer de coisas fluidas,
Gume de rocha rasga o vento:
Semanas tantas de existir
E de viver -um só momento.
Prisma empanado da retina
Que acalanta mundos sem prumo,
A luz que o fere perde o rumo,
Aclara a linfa submarina:
Prédios mergulham ramos de cimento,
Neons fazem dos olhos coágulos de seixos,
E esquinas lanham flancos desse rio sem peixes
De que sou fonte e náufrago no inteiro.
•
Décio Pignatari nasceu a 20 de
agosto de 1927 em Jundiaí. Formou-se em Direito pela Universidade de São Paulo.
Sua estreia na literatura — onde se firmou como poeta, ensaísta, ficcionista e
tradutor — acontece na Revista de Novíssimos juntamente com os irmãos Haroldo e
Augusto de Campos, com quais fundará mais tarde a poesia concreta e várias
outras atividades criativas como a Grupo Noigandres. Na poesia publicou, entre
outros, O carrossel (1950), Rumo a Nausicaa (1952), Organismo
(1960) e Exercício findo (1968). Morreu em São Paulo a 2 de dezembro de
2012.
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