segunda-feira, 20 de agosto de 2018

Dois poemas de Rabindranath Tagore traduzidos por Cecília Meireles




Última primavera

Antes que o dia termine,
consente-me este desejo:
vamos colher
flores da primavera
pela última vez.
Das muitas primaveras
que ainda visitarão
tua morada,
concede-me uma,
– implorei.

Todo este tempo,
não prestei atenção
às horas,
perdidas e gastas à toa.
Num lampejo
de um crepúsculo,
li nos teus olhos agora
que meu tempo está próximo
e devo partir.

Assim, ávido, ansioso,
conto um por um
– como o avarento o seu ouro –
os últimos, poucos dias de primavera
que ainda me restam.

Não tenhas medo
Não me demorarei muito
no teu jardim florido,
quando tiver de partir,
no fim do dia.

Não procurarei lágrimas
nos teus olhos
para banhar minhas lembranças
no orvalho da piedade.

Ah, escuta-me,
não te vás.
O sol ainda não se esconde.
Podemos permitir que o tempo
se prolongue.
Não tenhas medo.

Deixa que o sol da tarde
olhe por entre a folhagem
e se detenha um momento
brilhando no negro rio
do teu cabelo.

Faze o tímido esquilo,
perto do lago,
fugir de repente
ao estrépito de teu riso
que irrompe
com descuidosa alegria.

Não procurarei
retardar teus rápidos passos,
sussurrando esquecidas lembranças
aos teus ouvidos.

Segue teu caminho depois,
se teu dever é seguir, se tens de seguir
calcando folhas caídas
com teu andar apressado,
enquanto as aves que voltam
povoam o fim do dia
com o clamor dê seus gritos.

Na escuridão crescente,
tua distante figura
irá fugindo e apagando-se
como as últimas frágeis notas
do cântico da tarde.

Na noite escura,
senta-te à tua janela,
que eu passarei pela estrada,
seguindo o meu trajeto,
deixando tudo para trás.

Se te aprouver,
atira-me
as flores que te dei
pela manhã,
murchas agora ao fim do dia.

Isso vai ser
o último e supremo presente:
tua homenagem
de despedida.


Troca

Ela me trouxe flores de alegria
eu tinha comigo
os frutos da minha tristeza.

Quem sairá perdendo,
perguntei-lhe,
se trocarmos?

Encantada e risonha,
ela disse:
“Então troquemos:
minha grinalda é tua
e aceitarei
teus frutos de sofrimento”.

Olhei para o seu rosto
vi que era de uma beleza
implacável.

Bateu palmas, alegre,
e apanhou
minha cesta de frutos
enquanto eu suspendia sobre o coração
sua grinalda de flores.

Ganhei,
disse ela sorrindo
e retirando-se
logo.

O sol subiu
para o alto do céu
e fazia muito calor.

No fim do dia
sufocante
todas as flores murcharam
e perderam as pétalas.

Rabindranath Tagore nasceu em 7 de maio de 1861. Considerado um dos escritores mais importantes da literatura indiana, condição reconhecida por sua obra, reformuladora da literatura bengali. Feito que servirá a Academia Sueca a nomeá-lo para o Prêmio Nobel de Literatura em 1913, o primeiro não-europeu a receber essa honraria. Embora sua obra seja constituída basicamente por poesia, também escreveu prosa – contos e romances. Tagore morreu em 7 de agosto de 1941.

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