JONAS
Deparou pois o Senhor um grande peixe para que tragasse a Jonas
Jonas filho
de Amithai
fugindo de
uma missão perigosa
embarcou
numa nau que navegava
de Joppen a
Tharsis
depois se
deram as coisas sabidas
um grande
vento uma tempestade
a tripulação
joga Jonas nas profundezas
e o mar se
aquieta de seu furor
vem nadando
o peixe previsto
três dias e
três noites
Jonas ora
nas entranhas do peixe
que por fim
o vomita
na terra seca
o Jonas
contemporâneo
afunda como
uma pedra na água
se topa com
uma baleia
não tem
tempo nem de suspirar
salvo
procede mais
astutamente
que o seu
colega bíblico
pela segunda
vez não aceita
a missão
perigosa
deixa a
barba crescer
e longe do
mar
longe de
Nínive
sob um nome
falso
é
comerciante de gado e antiguidades
os agentes
do Leviatã
se deixam
subornar
não têm o
sentido do destino
são
funcionários do acaso
num hospital
asseado
morre Jonas
de câncer
ele mesmo
sem saber bem
quem era na
verdade
a parábola
aplicada na
sua cabeça
se extingue
e o bálsamo
da alegoria
não afeta o
seu corpo
SOBRE A ROSA
para Tadeusz
Chrzanowski
1
A doçura tem
nome de flor
Tremem os
jardins esféricos
suspensos
sobre a terra
o suspiro
vira a cabeça
a face do
vento perto da paliçada
a relva se
estende baixa
o tempo de
expectativa
a chegada
extinguirá os cheiros
a chegada
abrirá as cores
as árvores
constroem a abóbada
da quietude
verde
a rosa te
chama e tem saudade
de ti a
borboleta colhida
rompe-se um
fio trás o outro
passa um
instante trás o outro
ó larva
verde de botão
desabroche
a doçura tem
um nome: rosa
a explosão
de dentro
saem
os
porta-estandartes de púrpura
fileiras
incontáveis
os
trombeteiros das fragrâncias
nas longas
trombas de borboletas
proclamam a
plenitude
2
as coroações
intrincadas
os claustros
da oração
as
cerimônias cheias de ouro
os
candelabros chamejantes
as triplas
torres do silêncio
os raios
refratados nos cumes
o fundo –
ó fonte do
céu na terra
ó
constelações de pétalas
*
não pergunte
o que é uma rosa Um pássaro talvez a narre
a fragrância
mata os pensamentos a face com o leve roçar apagada
ó cor do
desejo
ó cor das
pálpebras que choram
a doçura
esférica grávida
o vermelho
rasgado até as entranhas
3
a rosa
inclina a cabeça
como se
ombros tivesse
se apoia no
vento
mas o vento
se vai sozinho
não
conseguirá pronunciar uma palavra
não
conseguirá pronunciar uma palavra
quanto mais
morre a rosa
mais difícil
é falar sobre a rosa
•
Zbigniew
Herbert nasceu em Lviv, na Polônia (região hoje integrada a Ucrânia) no dia 29
de outubro de 1924. Poeta, dramaturgo e ensaísta, autor de obras reconhecidas como
Facho de luz (1956), Hermes, o cachorro e a estrela (1957), O estudo do objeto (1961), Um bárbaro no jardim (1962) e Um labirinto à beira-mar, publicado
postumamente em 2000. Herbert morreu em 28 de julho de 1998, em Varsóvia.
*Traduções de Piotr Kilanowski publicados inicialmente na revista Qorpus.
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