segunda-feira, 25 de março de 2019

Três poemas de James Schuyler




O CÉU DEVORA AS ÁRVORES

O jornal chega. Ele
está empanturrado de más notícias.
O sol não está onde estava.
Nem a lua. Antes tão
plana, agora tão redonda. Um homem
carrega papéis para fora da
casa. O que provoca uma pequena
mudança. Eu leio à noite.
Eu pego o trem e vou
à cidade. E depois eu
volto. Mastic Shirley,
Patchogue, Quogue. E mesmo
tendo parado tantas
vezes, centenas, em suas
estações, isso é tudo
o que eu sei. Uma tem
uma madeireira. O sol
mostra seu sorriso.
O dia se expande
por volta das três da tarde. Depois,
ele desliza, frio e calmo,
rumo à noite. Eu leio
na cama. E de madrugada
eu ponho um disco para
me barbear. Na cidade numa
loja um homem tem olhos
azuis que encantam. Ele
é amigável e me parece interes-
sante, ainda que não seja
um homem interessante.
Notícia ruim é um tipo engraçado
de café da manhã. Viciado,
eu mal consigo comer minha
ração diária sem
seu recheio. Eu leio à
noite e me barbeio quando
me levanto. Isso é verdade.
A vida vai mudar e
eu sou parte disso e
vou mudar também. E também
você, e você, e
você, o secreto — o que é
secreto? — centro da
minha vida, seu nome e
voz entalhados como
as ranhuras de um LP na
minha vida, rodando sua
música entre as linhas
Eu leio à noite, um
grafite nas paredes
de papel florido eu
vejo, olhando por sobre as páginas
de Lady Mary
Wortley Montague ou de
um romance antigo barato.
Um silencioso louvor, sim,
é o que é, entre as
entre as linhas que leio à noite.


NA PRAIA

No feriado de 4 de julho, na praia,
as crianças do chalé vizinho
acendem fogos de artifício. Por mais rápido
que eles corram, parecem, da nossa varanda
não correr nada rápido (Estrelas
de fogos flutuando, as ondas de
detonação, um céu quente, pouco vento.)
Nós nos sentamos na varanda, no escuro
depois dos últimos estouros, um por vez
falando até que ventasse
mais forte, e então nós entramos.


POEMA

Eu nem sempre entendo o que você diz.
Uma vez, quando você disse, através, você queria dizer durante.
O que é, pela sua natureza, evidente.

O significado das palavras conta, à parte o que elas pesam:
poesia, assim como a música, não é apenas melodia.
Eu nem sempre entendo o que você diz.

Você detestaria, quando comigo, encontrar de dia
O que você quando à noite encontra e não acha ruim.
O que é, pela sua natureza, evidente.

Eu sinto um peso em sua atividade diurna,
um desejo de ficar de fora, sob admiração, na plateia.
Eu nem sempre entendo o que você diz.

Eu sou tímido quanto você. Por mais que tentemos,
somente com a prática nossas conversas avançarão.
O que é, pela sua natureza, evidente.

Nós falamos juntos de um jeito igual.
A arte, como a morte, é breve: vida e amizade, longas.
Eu nem sempre entendo o que você diz.
O que é, pela sua natureza, evidente.

James Schuyler nasceu em 9 de novembro de 1923. Foi uma das figuras centrais na chamada New York School, que, entre as décadas de 1950 e 1970, juntando poetas, artistas plásticos, músicos, dramaturgos e coreógrafos, colocou Nova York decididamente no centro da arte de vanguarda mundial. Autor de extensa obra, recebeu em 1980 o Pulitzer de Poesia pela antologia The Morning of the Poem. O poeta morreu em 12 de abril de 1991.

* Traduções de André Caramuru Aubert. Os poemas foram publicados pela primeira vez no jornal Rascunho.


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