segunda-feira, 2 de dezembro de 2019

Três poemas de Delmira Agustini




CEGUEIRA

Me abismo em uma rara cegueira luminosa,
um astro, quase uma alma, me velou a Vida.
Prendeu-se em mim como brilhante mariposa,
ou em seu disco de luz fiquei detida?

Não sei... Rara cegueira que me apagas o mundo,
estrela, quase alma, com que ascendo ou me afundo:
Dá-me tua luz e vela-me eternamente o mundo!


A RUPTURA

Era uma vez uma corrente forte como destino,
sacra como uma vida, sensível como alma;
cortei-a com um lírio e sigo meu caminho
com a frialdade magnífica da Morte... Com calma

curiosidade meu espírito se debruça no seu lago
interior, e o cristal das águas dormidas
reflete um deus ou um monstro, mascarado
numa esfinge tenebrosa suspensa doutras vidas.


NOTURNO

Engastado na noite o lago da tua alma,
dir-se-ia uma teia de cristal e de calma
tramada pelas grandes aranhas do desvelo.

Nata de água lustral em vaso de alabastros;
espelho de pureza que abrilhantas os astros,
e refletes o algar da Vida em um céu...

Eu sou o cisne errante dos sangrentos rastros,
vou manchando os lagos e remontando o voo.

Delmira Agustini nasceu a 24 de outubro de 1886 em Montevidéu. Foi um importante nome da chamada Geração de 1900 ao lado de Leopoldo Lugones e Rubén Darío. Autora de obra variada, seu livro de destaque é Los cálices vacíos, de 1913, pela entrada no movimento de vanguarda modernista. O repentino divórcio, apenas um mês e meio depois do casamento, foi a gota d'água para seu assassinato pelo ex-marido em 6 de julho de 1914.

* Traduções de Jessica de Figueiredo Machado.

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