CEGUEIRA
Me abismo em
uma rara cegueira luminosa,
um astro,
quase uma alma, me velou a Vida.
Prendeu-se
em mim como brilhante mariposa,
ou em seu
disco de luz fiquei detida?
Não sei...
Rara cegueira que me apagas o mundo,
estrela,
quase alma, com que ascendo ou me afundo:
Dá-me tua
luz e vela-me eternamente o mundo!
A RUPTURA
Era uma vez
uma corrente forte como destino,
sacra como
uma vida, sensível como alma;
cortei-a com
um lírio e sigo meu caminho
com a
frialdade magnífica da Morte... Com calma
curiosidade
meu espírito se debruça no seu lago
interior, e
o cristal das águas dormidas
reflete um
deus ou um monstro, mascarado
numa esfinge
tenebrosa suspensa doutras vidas.
NOTURNO
Engastado na
noite o lago da tua alma,
dir-se-ia
uma teia de cristal e de calma
tramada
pelas grandes aranhas do desvelo.
Nata de água
lustral em vaso de alabastros;
espelho de
pureza que abrilhantas os astros,
e refletes o
algar da Vida em um céu...
Eu sou o
cisne errante dos sangrentos rastros,
vou
manchando os lagos e remontando o voo.
•
Delmira Agustini nasceu a 24 de outubro de 1886 em Montevidéu. Foi um importante nome da chamada Geração de 1900 ao lado de Leopoldo Lugones e Rubén Darío. Autora de obra variada, seu livro de destaque é Los cálices vacíos, de 1913, pela entrada no movimento de vanguarda modernista. O repentino divórcio, apenas um mês e meio depois do casamento, foi a gota d'água para seu assassinato pelo ex-marido em 6 de julho de 1914.
* Traduções de Jessica de Figueiredo Machado.
Nenhum comentário:
Postar um comentário