LISTA DE COMPRAS
Fazia a lista de compras com um ar ligeiramente
Sonhador. Amachucava pedacinhos de papel
Que nos fim pareciam smarties.
- Estou sempre contigo, sempre.
- E tu pesas-me.
- Sem ti, sinto-me num vácuo.
- És de chumbo.
E na lista de compras lá vinha um quilo de arroz
Um litro de azeite, duas latas de atum.
O sol, como uma flor, fazia da cozinha
Uma festa, a que as cortinas conferiam ar de templo.
No fogão ardia o leite, ouvia-se o chiar
Da máquina de café e o coração
Como um atleta, cada vez mais pálido
Cada vez mais longe.
LINHA DO HORIZONTE
Crescer, sair de casa
para os fantasmas da rua e
envelhecer, na tortura
da meteorologia. Do que muda.
O medo, qual linha contínua,
porque a infância, os sonhos,
o peso da genealogia.
Dores e rugas, ruas e mais ruas,
com os seus becos e paredes sujas.
O medo sempre, essa moldura.
O medo de demolir, o medo do novo,
de não estar à altura.
O medo da tradição e do ridículo.
E mesmo assim querer. Querer muito.
Um lugar no tempo,
um quinhão do negócio,
um lugar na comitiva.
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Carlos Bessa
nasceu em Viana do Castelo em 1967; cresceu nos arredores do Porto e
vive, desde meados de 1990, nos Açores, onde trabalha. Alguns de seus livros são Legenda (1995), Olhos de morder lembrar e partir (2000) e Em trânsito (2003).
Estou confusa. Há um outro Carlos Bessa escritor de poesia,(especialmente orientado para o fado), nascido no Porto em 1592. Tenho um livro dele com o título de "Retalhos de um Porto esquecido". Quem me pode elucidar....
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