terça-feira, 21 de abril de 2020

Dois poemas de Gottfried Benn




SÍNTESE

Noite silenciosa. Casa silenciosa.
Mas sou a mais calma estrela,
Eu também produzo luz própria
Além dos limites de minha noite.

Cerebralmente, voltei para casa
De infernos, céus, lixo e gado
E também o que se concede à mulher
É obscura e doce masturbação.

Revolvo o mundo. Agonizo a presa.
E depois dispo-me na alegria:
Não há morte, nem pó malcheiroso
Que me leve, eu-conceito, de volta ao mundo.


HOMEM E MULHER PASSEIAM NO PAVILHÃO DO CÂNCER

O homem:
Nesta fila aqui estão ventres apodrecidos
e nesta está o peito apodrecido.
Lado a lado camas malcheirosas. As enfermeiras revezam-se a cada hora.

Vem, levanta sem medo esta coberta.
Vê esse monte de gordura e sumos putrefatos
para um homem um dia já foi tudo,
também foi êxtase, lar.

Vem, olha esta cicatriz no peito.
Sentes o rosário de pontos moles?
Toca, sem medo. A carne é mole e não dói.

Esta aqui sangra como se de trinta corpos.
Ninguém tem tanto sangue.
Desta daqui ainda tiraram
um filho do ventre canceroso.

Deixa-se que durmam. Dia e noite. – Aos novos
diz-se: aqui o sono cura. – Só aos domingos
para as visitas podem estar mais despertos.

Já se come pouco. As costas
são feridas. Vês as moscas. Às vezes
a enfermeira lava. Como se lavam bancos.

Aqui o solo já incha em torno de cada leito.
Carne nivela-se à terra. Brasa vai-se embora.
Sumo começa a correr. Terra chama.

Gottfried Benn nasceu em Mansfeld a 2 de maio de 1886. Estudou teologia e filosofia, mas a profissão que exerceu durante toda a vida, incluindo sua longa estadia no exército durante a Primeira Guerra Mundial, foi a de médico. Escreveu poesia e prosa; no primeiro gênero se destacou como um renovador da poesia lírica alemã e é um dos principais nomes do Expressionismo. Morreu no dia 7 de julho de 1956 em Berlim. 

* Traduções de Claudio Cavalcanti.

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