CAPRICHO
Penetre-me os olhos, surpreende-me a boca,
Agarre forte com suas mãos esta cabeça louca,
Dê-me de beber veneno, o veneno maldito
Que lhe lambe os lábios apesar de inofensivo.
De por quê chorei na noite passada;
Nós mulheres choramos sem saber o motivo:
Perguntar-se do choro é interrogar o infinito.
Um mar um pouco tolo, bestamente absoluto,
Que nos sobe aos olhos com frequência
Que conduzimos com imprecisa ciência.
Na noite passada não estava calmo o mar.
É tudo. Tempestades que o vento traz e leva
Vento vadio que novas costas navega.
Nosso interior é todo um vazio pleno.
Luz de cristais, fruto de carnavais
Decorado de escamas de serpentes fatais.
Mobilidade absoluta de inconsciente sedutor,
Desejamos e saboreamos o mel de cada taça
E na cabeça ainda temos um pouco brasa.
Capricho, meu querido, capricho deve ser.
Oh, me deixe rir… Não vê que a tarde é bonita?
Manche-se logo de sangue nessa rosa infinita.
Solta o seu canarinho que ele quer voar…
Eu sou o canarinho, homenzinho miúdo,
Me deixa pular.
homenzinho miúdo, mas que gaiola você me dá,
digo miúdo porque você não me entende,
nem nunca me entenderá.
abre logo esta gaiola, que eu quero escapar;
homenzinho miúdo, eu te amei por meia hora,
não me peça mais.
•
Alfonsina Storni nasceu a 29 de
maio de 1892 em Sala Capriasca, Suíça. Quando tinha quatro anos de idade a
família mudou-se para a província de San Juan, Argentina; jovem, vai viver em
Rosário, onde divide a vida entre garantir algum sustento e a compor uma obra
que só se tornará pública a partir de 1916 com a publicação de La inquietude
del rosal. Publicou ainda El dulce daño (1918), Irremediablemente
(1919), Languidez (1920), Ocre (1925), Mundo de siete pozos
(1934) e Mascarilla y trébol: círculos imantados (1938). Morreu no ano
de seu último livro, a 25 de outubro, em Mar del Plata.
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