ESTUDO ANATÔMICO
Entrei no anfiteatro da ciência,
Atraído por mera fantasia,
E aprouve-me estudar anatomia,
Por dar um novo pasto à inteligência.
Discorria com toda a sapiência
O lente numa mesa onde jazia
Uma imóvel matéria, úmida e fria,
A que outrora animara humana essência.
Fora uma meretriz: o rosto belo
Pude tímido olhá-lo com respeito
Por entre as negras ondas do cabelo.
A convite do lente, contrafeito,
Rasguei-a com a ponta do escalpelo
E não vi coração dentro do peito!
ROAST-BEEF
A Artur Azevedo
Atraído por mera fantasia,
E aprouve-me estudar anatomia,
Por dar um novo pasto à inteligência.
O lente numa mesa onde jazia
Uma imóvel matéria, úmida e fria,
A que outrora animara humana essência.
Pude tímido olhá-lo com respeito
Por entre as negras ondas do cabelo.
Rasguei-a com a ponta do escalpelo
E não vi coração dentro do peito!
Ela tem a beleza, a flácida estrutura,
Os contornos viris, geométricos, altivos,
A branca carnação dos bons modelos vivos
Do mágico buril dos Fídias da escultura.
Ressumbra-lhe a epiderme — alvíssima textura —
Os filtros sensuais, os tóxicos lascivos,
Que aos mártires da Fé, aos crentes primitivos,
Serviram de adoçar o cálix da amargura.
Ao vê-la, não cobiço os ócios dum nababo,
Nem penso num cavalo elástico do Cabo
Para furtá-la às mãos de um Jônatas patife.
Ouço um coro ideal e harmônico de beijos!
E sinto fervilhar-me o pego dos desejos
De um Tântalo faminto em face de um roast-beef!
À LIÇA
Não diz co’a evolução do século gigante!
De uns olhos sensuais,
Nos lôbregos covis,
Nas furnas imperiais,
E sedente e feroz! Na luta que a domina
Arroja-se de encontro à nossa irmã Jusça
Tentando-a sepultar no chão da enorme liça!
A Musa varonil da homérica epopeia!…
•
Antônio Vicente de Fontoura Xavier
nasceu a 7 de julho de 1956 em Cachoeira do Sul, Rio Grande do Sul. Cedo mudou-se
para o Rio de Janeiro para continuar seus estudos; depois para São Paulo, onde
inicia o curso de Direito. Data deste último período o início de sua atividade literária
como colaborador em vários periódicos do seu tempo; chegou a, com Arthur
Azevedo e Anibal Falcão, fundar o jornal Gazetinha. Traduziu ao
português Edgar Allan Poe, Charles Baudelaire, William Shakespeare. Na carreira
de diplomata serviu nos Estados Unidos, Cuba, México, Suíça, Argentina, Guatemala,
Inglaterra, Espanha e Portugal, país onde viveu até sua morte em 1922. Seu principal
livro de poesia, no âmbito do movimento parnasiano é Opalas.
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