terça-feira, 16 de novembro de 2021

Três poemas de José Juan Tablada



OS OLHOS EM ALVO
 
Sobre a relva esmagada,
sob a copa sombria
te reclinei desmaiada
quando a tarde morria.
 
Olhei tua face ruborizada
que pálida se tornava,
e senti tua boca gelada
sob o ardor da minha...
 
E antes de que agonizante
caísse sobre teu flanco
cravado meu último desejo,
 
olhei no supremo instante
até teus olhos em alvo
descer o ouro do céu!
 
 
NOITE DO TRÓPICO
 
Na fúnebre abóbada não brilham as estrelas,
jamais enlutou o céu mais lôbrego capuz...
E contudo estriado de tenebrosos rastros
sob o céu de ônix o mar é todo luz!
 
Sobre o profundo abismo a luz é móvel nata
de onde apenas um Érebo de sombras desliza,
e nessa tenebrosa película de prata
em pérolas se desfaz a onda que se encrespa.
 
Mas sobre a amurada o nauta que se inclina
teme que pareça um sonho seu rápido vislumbre
de incandescentes peixes e flora submarina
e anêmonas de fósforo entre árvores de  luz,
 
e — de um peixe luminoso ao lívido farol —
o cadáver de náufrago, que na sombra total,
com os ossos tão brancos que parecem de luz,
 
                é igual
                a uma cruz
                de cristal!...
 
 
ÍNTIMA
 
Já todo meu tesouro o carrego dentro
ostra rugosa, carne e terra.
 
Do porta-jóias pessoal
é o astro a pérola
que ilumina todos os mistérios.
 
Já não saio à varanda
se passa pela rua
com sua música o batalhão;
 
já não volto o rosto
se escuto às minhas costas
o retintim do ouro;
 
já não sigo o perfume
da puta graciosa
que dobrou a esquina.
 
Já todo meu tesouro
o carrego dentro.
 
New York, 1931
 
José Juan Tablada nasceu a 3 de abril de 1871, na Cidade do México. Sua vida no universo das letras começa desde aos dezenove anos quando começou a colaborar para o jornal El Universal com poemas e crônicas; sua permanência na imprensa do seu país e mais tarde fora dele foi contínua: El Mundo Ilustrado, Excélsior, Revista Azul, Revista Moderna, La Falange, entre outros. A estreia literária acontece com o livro de poesia El florilégio em 1899. A atividade como diplomata o fez morar em diversos países, como Colômbia, Venezuela, França, Japão e Estados Unidos, onde fixa residência até sua morte a 2 de agosto de 1945.
 
* Traduções de Ronald Polito.

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